terça-feira, 6 de novembro de 2007

Estou cego, pois enxergo


Interessante a experiência do apóstolo Paulo no caminho para Damasco, quando ainda era Saulo. Um dos pontos que mais me desperta a atenção é o de ter Saulo ficado três dias sem enxergar (Atos 9.9). Por que esta necessidade? Creio que Saulo jamais enxergou tanto como neste período em que esteve cego. Um jovem idealista que buscava fogo para queimar (9.1-2); agitado em viagens de perseguição, com sede de extermínio (9.21). Para enxergar a realidade teve de ser sossegado pelo Senhor com um período de reflexão, sem subterfúgios para o entreter. Assim, por três dias, enxergou, avaliou e tomou decisão como nunca antes (Filipenses 3.4-11).

Em um mundo onde imperam a velocidade, a ganância e a abstinência moral, a realidade às vezes só se apresenta nítida àqueles que perdem a visão para o corriqueiro. Enquanto “enxergam” são deficientes quanto ao escutar, e ao reparar; assim como ao toque, e à necessidade alheia. Quando alguém perde a visão passa, por necessidade, a exercitar a atenção; conseqüentemente passa a ser mais gente, usar mais o coração; passa a dar mais valor para a solidariedade. Assim, se perde a visão, mas se recupera a lucidez; se perde a visão, mas se recupera o diálogo, principalmente com o Criador.

Enquanto o homem age como senhor, levado por aquilo que enxerga, atropela a verdade e a real necessidade de todos (sua e a dos que convivem com ele). Para ocorrer mudança, é preciso arrependimento e conversão. Esta só se apresenta quando é cegado para o eu. Então, como “cego” passa a enxergar com os olhos do Senhor. Somente assim, moral e espiritualmente falando, pode com alegria dizer: “estou cego, pois, enfim, enxergo!”. E não se torna alvo da repreensão do Senhor:
“Surdos, ouvi, e vós, cegos, olhai, para que possais ver. Quem é cego, como o meu servo, ou surdo, como o meu mensageiro, a quem envio? Quem é cego, como o meu amigo, e cego, como o servo do Senhor? Tu vês muitas coisas, mas não as observas; ainda que tem ouvidos abertos, nada ouves.” (Isaías 42.18-20)