sexta-feira, 18 de julho de 2008

Batidas...


Batidas. O tempo se mede com batidas. Seja com as de um relógio, ou do coração. Os gregos tinham duas palavras diferentes para indicar esses dois tempos. Ao tempo que se mede com as batidas do relógio - embora não tivessem relógios como os nossos - davam o nome de chronos. Daí a palavra “cronômetro”.

As batidas do relógio insistem numa absoluta indiferença à vida. Vai dividindo o tempo em pedaços iguais: horas, minutos, segundos. Não importa se há riso ou choro, vida ou morte; suas batidas são frias, e duras de se agüentar.

Há, entretanto, o tempo que se mede com as batidas do coração. A estas batidas falta a precisão dos cronômetros, pois dançam ao ritmo da vida (e da morte). Batidas tranqüilas, e de repente agitadas. Tocadas pelas emoções, dá saltos. Tropeça. Retorna à rotina. A esse tempo os gregos davam o nome de kairós.

Chronos é um tempo sem surpresas. Kairós, ao contrário, vive de surpresas. Nunca se sabe quando sua música será lenta, ou animada; calma ou estressada. O relógio nos diz com precisão o número de dias, horas e segundos decorridos desde o nosso nascimento. Porém, o nosso coração nada sabe sobre esses números. Quando me lembro de algumas experiências, é como se as tivesse vivido ontem.

Nossos filhos crescem (os meus são adolescentes). De vez em quando, nos damos conta disto, e mal acreditamos. Quando somos guiados por chronos lembramo-nos de que estamos envelhecendo. Porém, quando guiados por kairós percebemos que estamos vivendo.

Quem sabe somar e multiplicar tem a chave para entender as medições de chronos. Porém, esta chave não funciona para o coração, pois kairós mede a vida pelas pulsações das emoções. Kairós mede a vida por saudades. Toda saudade é uma espécie de velhice. Velhice não se mede pelos números de chronos; ela se mede por saudade. Saudade é o corpo brigando com o chronos, não suportando perder o que se ama. É como a criança e o colo que o tempo levou, mas que não gostaríamos de que tivessem sido levados! E isto nada tem a ver com horas, minutos, e segundos; mas, sim com emoções experimentadas por kairós.

Heráclito, filósofo grego, afirmou que o “tempo é criança brincando, jogando”. Crianças odeiam chronos, odeiam as ordens que vêm dos relógios. As crianças não usam relógios para marcar tempo; usam relógios como brinquedo; usam prazer, emoção, usam seus próprios corpos. Criança é kairós brincando com chronos, como se ele fosse bolhas de sabão...

Salomão afirmou em Eclesiastes 3.1-15, que há tempo para todo propósito debaixo do céu. E que o Senhor o determinou para nossa experiência. A começar por tempo de nascer e tempo de morrer. Porém, como resultado de sua experiência de vida afirmou em todo o livro que enquanto há fôlego é tempo de viver. O que inclui alegrias e tristezas, vitórias e derrotas, entre tantas outras coisas. Mas, sempre é tempo de viver, pois a morte chega quando não temos prazer em nossos dias. Quando se escurece o sol, a lua e as estrelas. Quando tudo se transforma em medo e dor. Em dias assim, as batidas que imperam são as de chronos, aguardando somente a partida final. O romper do fio de prata; o despedaçar do copo de ouro; o voltar do pó a terra, e do espírito a Deus, que o deu.

A cada fim de ano chronos faz as somas e me diz que fiquei mais velho. Então, kairós vem em meu socorro para espantar a tristeza. Vem como criança, brincando com chronos. Lembrando-me de que mais valioso do que envelhecer, é viver. Ter um relacionamento de amor com a vida. E, quando sou levado pelas batidas de kairós, acontece uma estranha metamorfose: deixo de ser velho. Sou criança de novo..., experimentando vida abundante.