terça-feira, 2 de junho de 2009

Amigo é aquele que também erra!


Procura-se um amigo. Alguém em quem confiar. Que seja a expressão perfeita da fidelidade, e do companheirismo. Alguém que saiba guardar segredo. E, acima de tudo, que não falhe. Que nunca minta, traia, e esteja indisposto. Enfim, procura-se por toda parte aquele que é perfeito para equilibrar o relacionamento, completando alguém que é imperfeito.


É certo que o imperfeito almeja o amigo perfeito; mas, será que o perfeito amigo desejará se relacionar com alguém imperfeito? Qual seria o benefício do amigo perfeito em se dedicar a alguém que muito deseja, mas, não tem tanto a oferecer?


De que lado você estaria? Em qual dos personagens você se encaixaria: no perfeito amigo ou naquele que deseja um amigo perfeito?


Interessante a compreensão que se tem do perfil de “amigo”. Esta idéia de que amigo é aquele que não erra, não falha, não vacila. Provavelmente, esta compreensão tem sua raiz na afirmação de que quem ama não é infiel, nem mesmo por algum momento. Não vacila em seus sentimentos, e em sua vontade de estar ao lado do alvo de seu amor. Nada mais falso! Bonito, desejado, idealizado, porém, falso, por ser impossível de ser alcançado.


Se assim o fosse nenhum homem amaria ao Senhor. Ninguém seria seu amigo, e desfrutaria de sua amizade. Somos pecadores, o que implica em instabilidade. Somos cheios de convicções que se entrelaçam, se transformam, e, às vezes, são ignoradas, quando não esquecidas. O próprio Senhor afirmou a nossa realidade: “Enganoso é o coração, mais do que todas as coisas, e desesperadamente corrupto; quem o conhecerá?” (Jeremias 17.9). O Senhor afirmou no versículo seguinte que ele é quem esquadrinha o coração do homem. Ele é quem o conhece, e o resultado é este: corrupção. A possibilidade de termos uma amizade com o Senhor não está em nossa "perfeição", mas sim na graça do Perfeito.


É claro que o homem deseja um amigo fiel, conforme a descrição da perfeição. Afinal, ele não quer olhar para alguém que o lembre de sua pecaminosidade. Ele detesta a idéia de olhar para o outro é enxergar a si mesmo, na mentira, na traição, na falha que irrita. A esperança é a de ter alguém ao lado que compense o pouco que pode dar. Ter alguém que o ajude a ser melhor do que é. Por isso, o sonho utópico de um amigo perfeito.


Utópico por ser irreal. Jó afirmou: “Os meus amigos zombam de mim, mas os meus olhos se desfazem em lágrimas diante de Deus” (16.20). Nada mais natural, afinal não se espera de todo amigo, autenticidade? Não se cobra que fale a verdade, somente a verdade? Seus amigos expressaram os seus pensamentos, as suas conclusões. Com autenticidade afirmaram que ele estava em pecado. Estavam errados diante de Deus, mas, foram autenticamente amigos.


Davi afirmou: “Até o meu amigo íntimo, em quem eu confiava, que comia do meu pão, levantou o contra mim o calcanhar” (Salmo 41.9). Este amigo, mesmo que errando, expressou a essência de sua alma pecadora. Ele agiu em conformidade com o que era. Não é isso o que normalmente as pessoas esperam de seus amigos?


Que tipo de atitude se pode esperar de pecadores autênticos; de pecadores que falam e agem em sintonia com a essência do que são? Se um amigo somente acertar, e nunca falhar, estará agindo com falsidade, passando uma imagem do que realmente não é; pois não existe alguém assim.


Provavelmente, o melhor conselho sobre a amizade está em Provérbios 27.17: “Como o ferro com o ferro se afia, assim, o homem, ao seu amigo”. Isto implica em realidade em ambas as partes. Não há perfeição. Há, sim, entendimento do que são, e de que mesmo sendo imperfeitos desejam trabalhar em sintonia para melhorarem um ao outro. Desejam, assim como Deus, cultivar um relacionamento através de uma dose generosa de graça, de misericórdia. O acerto de um com o erro do outro; os acertos de ambos; assim como seus erros ...


Não há pessoa perfeita. Portanto, se queremos um amigo que nos seja autêntico, lidaremos com tudo aquilo que fluirá de sua alma pecadora. Pela graça de Deus, coisas boas. Pela realidade da natureza pecaminosa, coisas desagradáveis, ruins, indesejáveis. A possibilidade de uma amizade real está na compreensão de dois fatos: Amigo é aquele que também erra. E, somente o Senhor é quem merece toda a consideração, toda a nossa confiança; pois ele, sim, é perfeito. “Maldito o homem que confia no homem, faz da carne mortal o seu braço e aparta o seu coração do Senhor! Bendito o homem que confia no Senhor e cuja esperança é o Senhor” (Jeremias 17.5, 7).

segunda-feira, 1 de junho de 2009

Nossa vocação missionária

A particularidade de sermos povo exclusivo de Deus, e termos de testemunhar de sua grandeza, não é exclusividade da Igreja. Não é a partir do segundo testamento (NT), com a ordem deixada por Cristo, que a obra missionária é iniciada. Missões não começa no “ide” (ou “indo”).


Esta realidade é encontrada na razão da existência do povo de Israel. A razão de sua existência revela sua ligação com o Senhor, inibindo todo o temor, e impulsionando-o a obra missionária. Compreendemos a distinção entre Israel e Igreja. São povos distintos, com características distintas: Israel recebeu do Senhor um nome, uma identidade; assim como uma constituição; e uma terra. As promessas recebidas dizem respeito à realidade terrena. Suas guerras são contra as nações que lhe fazem oposição. Já a Igreja recebeu do Senhor uma identidade; porém, as promessas recebidas dizem respeito à realidade celestial. E suas guerras são contra o reino das trevas (principados e potestades). São povos distintos; que em momentos distintos, representam o Senhor na terra; manifestando sua existência e sua vontade soberana.


Considerando Isaías 43.1-13, como exemplo, visualizamos a essência da vocação missionária de Israel. O Senhor, através do profeta, exorta a Israel a não temer; e dá as razões para isso:


1. Porque Israel é criação de Deus (43.1). Povo que recebeu um nome, uma identidade. Povo que se tornou família do Senhor. O Senhor é apresentado como o parente remidor; como aquele resgatou sua propriedade familiar. Esta é a essência de “remir”. Através de Isaías Deus torna claro que trataria a Israel como membro de sua família; reclamaria seus direitos e cumpriria suas obrigações para com ele. E tudo isto, então, redunda que Israel pertence ao Senhor. É povo de propriedade exclusiva de Deus. E o Senhor andaria com eles (43.2-3).


2. Porque Israel é estabelecido pelo Senhor (43.5-6). Ele é quem reunirá a toda a sua descendência; o que parece, inclusive, nos incluir; referindo-se a reunião de todos os eleitos; como diz no v.7: a todos os que criei para a minha glória. E esta é exatamente a outra razão para não temer; pois fomos (incluindo a Igreja) criados para a sua glória. Ele é glorificado por nós (43.7). O que implica, obrigatoriamente, que nossa vida, mesmo que através da água e do fogo, exaltará o Deus da nossa salvação. E é interessante a compreensão de Deus acerca disto; pois, como afirma no início do v.7, os filhos de Deus compartilham tão amplamente de sua vida que não são mais tratados pelo próprio nome, mas sim pelo nome de seu Senhor. Isto é, sua identidade é totalmente ligada à daquele a quem glorificam.


3. Porque Israel é testemunha de Deus (43.10). Interessante a afirmação categórica de Deus, por meio do profeta, que esta função se inicia na escolha soberana de Deus para a salvação. Três verbos fortes: conhecer, crer e compreender. Uma seqüência lógica no processo de reconhecer quem Deus é. A forma de conhecer o “Eu Sou”.


Israel é testemunha do Deus, Salvador (43.11-12). Por todo o livro de Isaías, esta declaração ecoa. A soberania de Deus em criar, em sustentar, em escolher um povo para si, em salvar este povo, e em fazê-lo entender todo este processo (exemplo: 44.6-8).


Israel é testemunha do Deus eterno que tudo pode (43.13). E que estabelece a sua vontade sobre tudo e todos; mas, de maneira especial sobre o seu povo.


Enfim, Israel é exortado por Deus a não temer, porque toda a sua realidade: origem, salvação, vida e futuro; incluindo sua tarefa, está ligada ao Deus de sua salvação.


Esta compreensão de Israel ser povo de propriedade exclusiva de Deus, com uma tarefa específica de testemunhar esta familiaridade; e a forma como isto se torna possível, isto é, a forma do homem ter um relacionamento íntimo com Deus, é aplicada totalmente a nós, como igreja do Senhor:


“Vós, porém, sois raça eleita, sacerdócio real, nação santa, povo de propriedade exclusiva de Deus, a fim de proclamardes as virtudes daquele que vos chamou das trevas para a sua maravilhosa luz; vós, sim, que, antes, não éreis povo, mas, agora, sois povo de Deus, que não tínheis alcançado misericórdia, mas, agora, alcançastes misericórdia” (1 Pedro 2.9-10).


Somos povo de propriedade exclusiva de Deus para servir de testemunha de sua glória. Assim, a razão de nossa existência revela nossa ligação com o Senhor, inibindo todo o temor, e impulsionando-nos a obra missionária. Esta é a razão de missões. Esta é a essência de nossa vocação.